Escola da Várzea

O processo de criação da Escola Mista da Várzea remonta aos finais do Século XIX, por requerimento da Junta de Paróquia dos Ginetes, – presidida pelo ilustríssimo Frederico Jácome Correia –, ao Governador Civil do Distrito, conforme ata lavrada em 16 de Novembro de 1879.

Foi no decorrer do ano escolar de 1885/1886 que foi criada, por decreto régio a Escola Pública da Várzea, a qual funcionou logo após à aquisição de instalações adequadas, por parte da Câmara Municipal de Ponta Delgada e da Junta de Paróquia dos Ginetes. A referida Junta de Paróquia ofereceu um subsídio de 15.000rs para o mobiliário escolar, assumindo o encargo com a residência de professores, livros e material escolar para as crianças pobres.

A criação da Escola Mista da Várzea representou um dos mais importantes acontecimentos registados na vida deste Lugar, para além de se inscrever num ciclo cultural que marcou uma das épocas de maior representatividade na história local e dos Açores.

Importa referir que já no ano de 1886, a escolas públicas e particulares existentes em São Miguel, eram de 116 estabelecimentos, estando ainda a funcionar 8 cursos noturnos, com a ajuda dos Municípios e das Juntas de Paróquia. 

A expansão em São Miguel da Sociedade dos Amigos das Letras e Artes influenciou consideravelmente a situação da Escola da Várzea. Por sua iniciativa funcionou ali mesmo, uma Escola noturna para instrução primária, onde Castilho ensaiou o seu método de leitura repentina "para o ensino rápido e aprazível de ler, escrever e bem falar", bem como o ensino de trabalhos domésticos e agrícolas. Aliás, foram a Várzea e as Sete Cidades as últimas localidades onde aquela prestante Sociedade manteve escolas primárias em funcionamento.

Outro movimento cultural de certo modo inovador nesta Escola foi o da aprendizagem do Sistema Métrico, que passou a fazer parte da formação profissional dos professores do Ensino Primário que, por sua vez o transmitiram aos seus alunos.

Igualmente inovadora, foi a aplicação do Método de João de Deus, o qual procurou elevar a instrução popular nas aldeias rurais.

As áreas curriculares do ensino primário dividiam-se em dois graus: o elementar e o complementar, havendo escolas mistas – como era o caso da Várzea – para ambos os sexos, desde que a idade dos alunos não fosse superior a 10 anos.

Inicialmente, a frequência à escola era irregularíssima, talvez por falta de gosto ou pela indiferença dos pais das crianças. Daí que algumas advertências públicas, foram a causa para uma maior frequência à escola.

A propósito da frequência escolar o Comissariado de Estudos de São Miguel enviou a seguinte nota ao administrador do Concelho, que a transmitiu às Juntas de Paróquia:

“Os pais, tutores e outros quaisquer indivíduos, residentes nas povoações em que estiverem colocadas as Escolas de Instrução Primária ou dentro de um quarto de légua em circunferência delas, deverão mandar instruir nas mesmas Escolas os seu filhos, pupilos ou outros subordinados desde os 7 anos até aos 15 anos de idade. Os que faltarem a este dever serão sucessivamente avisados, intimados e repreendidos pelo Administrador do Concelho e ultimamente multados desde 500 até 1.000rs”.

O plano de estudo da Escola Mista da Várzea foi preconizado pela reforma da Instrução Primária de 1870, implementada por D. António da Costa, que foi o primeiro, Ministro da instrução em Portugal.

O ensino elementar praticado abrangia as seguintes áreas:

- Leitura e recitação de prosa e verso
- Caligrafia e exercícios de escrita
- Aritmética e Geometria
- Gramática e exercícios de Língua Portuguesa
- Sistema legal de pesos e medidas
- Elementos de Cronologia, Geografia e História de Portugal.
- Desenho livre e suas aplicações mais comuns
- Moral e História Sagrada
- Noções elementares de higiene
- Economia doméstica

As “observações” anexas ao programa recomendavam aos professores que “começariam por ensinar aos alunos a leitura pela letra de imprensa, fazendo-lhes conhecer e pronunciar bem distintamente cada uma das letras nos seus diferentes sons; e repetindo este trabalho para a pronúncia correta das sílabas e das palavras ou dicções…”.

A letra manuscrita "seria gradualmente empregada em quaisquer escritos, desde os mais legíveis aos mais embaraçados, à exceção daqueles que nas circunstâncias dos principiantes lhes pudessem ser prejudiciais, ou pelo objeto ou pelos erros de ortografia ou de linguagem que contivessem".

Quando "os alunos estivessem suficientemente versados na leitura e na escrita, o professor ensinaria a escrever os algarismos, fazendo-lhes aprender o artifício numeração”.

De acordo com as disposições regulamentares então em vigor, funcionaram nos Ginetes e na Várzea, cursos noturnos. Estes cursos noturnos destinavam-se a continuar a atividade da Escola, proporcionando "ao adulto a facilidade de adquirir ou aperfeiçoar a cultura do espírito, aproveitando o tempo disponível das outras ocupações da vida".

As Câmaras Municipais e as Juntas de Paróquia contribuíam com a luz e com os utensílios necessários para que essas Escolas Noturnas pudessem funcionar, porquanto as mesmas "eram públicas e gratuitas para os alunos quando os professores que as regessem usufruíssem de uma gratificação paga pelo Estado, Município ou Junta de Paróquia".

As matrículas abrangiam pessoas maiores de 14 anos, exceto " se os pais; pela muita pobreza, não pudessem prescindir do trabalho dos filhos no tempo em que funcionassem aulas diurnas".

Notória se tornava pois a frequência desses menores nessas Escolas Noturnas, porquanto era patente a necessidade da ajuda a prestar pelos filhos nos trabalhos agrícolas e domésticos.

No intuito de alargar esse benefício a muitas localidades de São Miguel, o Comissário de Estudos solicitava às Câmaras Municipais, Juntas de Paróquia e aos "cidadãos beneméritos", que auxiliassem a criação desses cursos "com os utensílios ou luzes de que necessitavam".

Igualmente o Comissário de Estudos se congratulava pelo facto de "haver alunos que procuravam a instrução e porque estes, pelos seus trabalhos não podiam assistir às lições diurnas, os autorizava a frequentar as aulas noturnas".

Como material de apoio foram remetidos aos Cursos Noturnos "cartilhas, lanternas e velas, tudo quanto oferecia o Comissariado para dar o primeiro impulso a essa tão reclamada e útil lição noturna".

O percurso pedagógico que, nas suas linhas gerais tem sido seguido na Escola da Várzea ao longo dos seus 124 anos de existência, tantas vezes em atitudes de carinho e de entreajuda, tem levado os alunos a integrarem-se no mundo, através de uma atitude sempre renovada de ideias e de comportamentos.

A instalação das Escolas obedecia a critérios diversificados, contando-se sempre com a comparticipação das Câmaras Municipais e Juntas de Paróquia.

Assim, recomendava-se que "a situação da Escola devia ser em lugar saudável, central, de fácil acesso, desviado das estradas de muito movimento; ter uma área a ser ocupada pela Escola e vivenda da professora".

A habitação da professora destinava-se a "aliviá-la de um encargo e de um cuidado, prendia-a mais à Escola, identificava-a com ela, dedicando-se com mais gosto à sua laboriosa profissão".

Inicialmente a Escola da Várzea foi regida por uma mestra particular, paga pela Junta de Paróquia, até ao provimento da cadeira pela professora legalmente habilitada, Jacinta da Glória, em 22 de Junho de 1887.

A casa (imagem ao lado) que serviu de instalação da antiga escola e nela residiu a mestra e ao que consta uma sua irmã, situava-se na rua da Igreja, pagando a Junta de Paróquia e a Câmara Municipal a renda anual de 30.000rs.

Era considerada uma casa "confortável", com um grande quintal, todo ajardinado, confinando na ribeira. As condições do edifício eram boas, bem como o estado de conservação.

O mobiliário era constituído por 13 bancos, 8 mesas, sendo uma para a professora, 1 estrado e 1 quadro preto. Possuía 1 livro de matrícula e 1 caderno de Frequência.

A partir de 1900 notava-se que "a mobília era antiga, toda em pinho resinoso", sendo o material escolar ampliado com 1 balança, 1 coleção de pesos de ferro e latão uma outra para líquidos, 1 relógio e 1 coleção de cartas murais para o ensino da leitura.

A professora Jacinta da Glória viveu vários anos na casa onde funcionava a Escola e casou com António Carreiro da Mota, que para manter a esposa a trabalhar naquele lugar, adquiriu a referida casa ao Estado.

Nesta casa funcionou a Escola Mista da Várzea, – ininterruptamente cerca de 100 anos –, até ao ano escolar 1982/1983, já propriedade do Sr. Hermano Oliveira Pavão, neto da professora Jacinta da Glória.

Atendendo a uma das aspirações da população da Várzea, no ano de 1982, o Governo Regional dos Açores, construiu um novo edifício Escolar de duas salas de aula do tipo “R3”, abrindo este as portas no ano escolar 1983/1984.

Em Julho de 1985, as Escolas da Várzea e das Sete Cidades assinalaram os 100 anos da sua criação, evidenciando o percurso pedagógico e sociocultural atingidos. Importa referir que as duas Escolas foram criadas no mesmo ano.

Na Várzea, vários atos assinalaram esta histórica data, salientando-se a realização de uma visita de estudos às Furnas e de outras atividades pedagógicas e culturais que vieram depois a concretizar uma exposição de trabalhos que constitui uma retrospetiva histórica e bibliográfica de um percurso pedagógico já centenário.

Assim, no dia em que os estabelecimentos de ensino primário encerravam as suas atividades para 1984/1985, a Várzea decidiu comemorar este importante acontecimento, bem como a inauguração oficial da sua nova escola, pois, de acordo com os elementos em arquivo, datava de Junho de 1885 a publicação do Decreto da criação da escola.

O Secretário Regional da Educação e Cultura, em representação do Presidente do Governo Regional, bem como a Câmara Municipal, a Junta de Freguesia e a Direção Escolar associaram-se a este ato, ressaltando-se o facto histórico que passava, bem como o trabalho ali desenvolvido em prol do povo da Várzea.

Nas duas amplas salas de aula que constituem o novo edifício, esteve patente uma exposição na qual se via não só diversas notas monográficas referentes à localidade, usos e costumes, bem como a reprodução de documentos que se referiam ao percurso pedagógico desenvolvido nos últimos 100 anos em São Miguel, incluindo material didático, livros e cadernos de apoio aos alunos.

Vários trabalhos desenvolvidos pelos alunos ao longo do ano encontravam-se também expostos, os quais abrangiam as diferentes áreas dos programas do Ensino em vigor.

As alunas dos cursos ministrados pela Educação Permanente também expuseram os trabalhos que haviam executado, nomeadamente malhas e bordados, havendo ainda outras peças de artesanato feitas por elementos da Comunidade que muito valorizaram não só o certame, como igualmente toda a perspetiva histórica que o acontecimento proporcionou".

Por ser corrente o interesse  do cultivo da Filatelia nas Escolas, contribuindo para se imprimir uma dinâmica renovada a toda a atividade educativa, pois o selo é um material de apoio de fácil aquisição, por ser acessível em todas as casas, como normal portador de tantas mensagens de fraternidade, a Direção Escolar de Ponta Delgada mandou cunhar um carimbo filatélico comemorativo dessa efeméride centenária.

Tratou-se da primeira emissão criada a nível da Região para assinalar um acontecimento ligado ao Ensino Primário, o que transplantou este facto histórico de há 100 anos para longínquas paragens, recebendo-se as mais inequívocas provas de solidariedade.

Procurou-se que a simbologia do desenho que ornamenta o carimbo fosse inteiramente voltada à cultura, como um conjunto de estruturas sociais, religiosas e artísticas que caracterizam uma sociedade, nomeadamente a Escola, centro de toda a vida, para compreender, conhecer e cultivar os fenómenos ligados ao ensino e à educação dos povos.

O facho é representativo do caminho seguro que serve de luz intelectual a professores e alunos, ambos mensageiros da esperança e da boa-nova.

Ao longo destes 124 anos, numerosos professores trabalharam na Escola da Várzea, sendo Jacinta da Glória, – natural do Pico da Pedra – a primeira professora que aqui lecionou, por um período de cerca de 23 anos. Apraz referir uma outra professora que marcou uma geração que entusiasticamente a recorda; a D. Maria de Lourdes Moreira, – esposa do Sr. Ramiro Fernandes Vasconcelos, conceituado comerciante deste lugar –, que lecionou nesta Escola durante 34 anos – 1927 a 1961.

No ano escolar 2000/2001 a escola da Várzea, passou a dispor do ensino Pré-Escolar, funcionado o mesmo num anexo da Igreja.

Por indicação da antiga Direção Escolar de Ponta Delgada, em 11/05/1997, foi dedicado um patrono à Escola da Várzea. O ilustre Dr. Carlos Pavão de Medeiros, Médico, Hidrologista, que residiu na Várzea durante cerca de 30 anos, onde prestou notáveis serviços. Até então, a Escola denominava-se por Escola Mista da Várzea.

A Escola EB1/JI Dr. Carlos Pavão de Medeiros, Várzea, está integrada na Escola Básica Integrada de Ginetes no âmbito da nova orgânica escolar implementada há poucos anos pelo Governo Regional dos Açores.

Fenomenalmente, como em outras localidades, a Várzea vai perdendo população residente, com a baixa taxa de natalidade, a opção dos jovens pelos grandes centros urbanos e o envelhecimento da população, reflectindo-se esta perda na comunidade escolar.

No ano escolar em curso (2009/2010), a Escola da Várzea tem 30 Crianças no Pré-escolar e 1º Ciclo do Ensino Básico, lecionadas por 1 Educadora de Infância e 2 docentes, com o apoio de 2 Auxiliares de Ação Educativa. Pontualmente, lecionam outros docentes no Apoio Educativo, Educação Física e Inglês.

No ano escolar de 2010/2011, a Escola da Várzea, à semelhança de tantas outras existentes pelas nossa Ilhas, encerrou a atividade letiva para o primeiro ciclo do ensino básico, mantendo-se apenas o ensino Pré-Escolar.

"Info Várzea"

Baseado no Livro: "100 anos da Escolas da Várzea e Sete Cidades", da autoria do Prof. Rubens Pavão.